quinta-feira, 15 de agosto de 2013

sábado, 10 de agosto de 2013

Quando olho pela janela...


                          Portais Mágicos

              Aeroportos são, definitivamente, meus portais preferidos. A gente entra por uma porta e quando sai, já é outro mundo. Fantasticamente. É nos aeroportos que eu me sinto plena, inteiramente eu, como vim a este mundo e como me despedirei dele. Sozinha, com pouca coisa nas mãos pra dizer que é minha, e só de passagem. Alguma coisa me acompanha, de alguma forma, numa mala pequena. Tudo muito imprensado, apertado dentro dela; Alguma coisa que eu talvez precise, outra só por precaução. Muito do desnecessário que a gente insiste em carregar consigo. Os líquidos e os cortantes me acompanham ali, de longe. A modernidade líquida e cortante. Desnecessária. Ao atravessar meus portais sempre me deparo, de repente, com ela: a mala cheia do vazio que me segue. A plenitude tá comigo, me acompanha de perto, dentro de mim. Só e plena, sigo ritualmente a desesperadora e gostosa passagem. Pelo saguão, inteira e volátil, piso o chão feito rio, que nasce e morre a cada passo, e que, por isso, a cada milímetro a frente já não é o mesmo.                
               Na lojinha de presentes, a moça procura a lembrança que vai levar da cidade do sol pra sua mãe, pro seu irmão, pro seu avô.  Eu, a olhar o espelho bonito da vitrine, encontro os meus olhos e procuro a lembrança que vou levar pra mim mesma quando atravessar o portal. Vou levar de mim o cheiro de água corrente; e do que morre ali no espelho (e sempre morre algo) deixo pra moça da loja, que me olhou nos olhos e não disse nada. A família se enche de fast food antes do voo pra Bariloche. A mulher sentada na mala, não por falta de assento, parece ser do tipo que senta na mala pra que o desnecessário não fuja de perto dela. Aquele senhor, que sempre tá dormindo ali na cadeira azul, deve ter um reloginho no coração que o acorda no horário certo de embarque. A criança empurra o carrinho de malas, como quem empurra as esperanças pra o amanhã. O som ambiente da loja do lado, quase me esqueço de mencionar,  não decide entre o regional e o sei lá o que. É preciso agradar a todos. Não agrada ninguém. Na verdade, ninguém ouve o que toca ali. O barulho do aeroporto é barulho de gente coberta de ansiedade. Gente ao telefone, cheia de saudade, de dor, ou de alívio. Ou até gente que muda de Estado como quem vai da sala pro quarto, sem ao menos parar pra olhar a pintura pendurada no corredor. 
               
             O desnecessário já foi despachado. Vou-me inteira e breve respirando o cheiro de transição. Não me dou o direito de conversar com ninguém. A passagem deve ser só minha. Alçar voo e me encontrar do outro lado, uma outra parte do inteiro que me segue com uma outra parte do inteiro que eu majestosamente crio. Aeroportos são portais lúdicos. Eu...ainda não sei o que sou, mas posso ser lúdica também e, dentro dos portais me acho em essência e livre das criações. Me vejo plena e vazia, sozinha e finalmente encontrada, liberta por alguns instantes das verdades que a gente inventa a cada pisar e a cada olhar que a gente topa, em um mundo e outro. Pronta para criar, me faço flor arrancada e sem raiz. E voo.

Em dezembro de 2012.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Publicando...

"A Fortaleza dos versos inacabados", crônica publicada 
na Coluna Olhar sobre a cidade da Revista Siará
-Diário do Nordeste no domingo, 
4 de agosto de 2013.
















          

A Fortaleza dos versos inacabados

         Descobri há algum tempo (no eterno descobrir das coisas) que, para todo e qualquer poeta, os lugares não inspiram poesia, eles são a própria poesia.

     Uma cidade é rabiscada de versos calados, e cabe aos poetas mastigá-los em essência, triturar partícula por partícula de cheiro e cor, de lágrimas e sorrisos, arrastando os pés descalços em toda sua textura de asfalto ou terra batida para, só depois, cuspir versos no denunciar da ilustração, versos medidos ou desmedidos, cantados, gritados, sussurrados num livro de cheiro bom ou na parede de uma escola qualquer. 

       A Fortaleza que descobri, há pouco, é uma fortaleza de sensações, que brada a ressaca do mar até o sertão, é fortaleza poética que inspira amor e ódio. Abençoado seja quem a batizou, Fortaleza! A palavra é forte, não por ser inabalável, mas por conter tudo e mais um pouco do que cabe num coração. E, sabe-se bem, não precisa ser poeta pra pesar o quanto cabe num espírito, feliz ou despedaçado que seja.

         A Fortaleza em que cabem a força dos verdes mares, dos pescadores, das jangadas que partem na madrugada, as histórias à beira-mar, as corridas em fim de tarde que levam ao Mucuripe, as banquinhas de peixe, as Iracemas e os Martins a assistirem ao nascimento dos novos guerreiros, o pôr do sol nos “píers” da Praia de Iracema, o aglomerado solitário dos prédios a desviar a teimosa maresia. 

        A cidade guarda, ainda, o vendedor de coco e de tapioca, a saída apressada dos shoppings e centros comerciais, as conversas de escritórios, as buzinas de ônibus.

        Feito coração pulsante, a cidade é tomada de sentimentos, e as lágrimas tem escorrido nos estádios e nas ruas, nos prós e nos contras, aos gritos de gol ou de revolta. Os olhos vêm denunciando um brilho cada vez mais forte, dignos dessa terra que teima em ser dona do sol. 

       Sob o calor que escalda ou a chuva que lava, os espíritos tem se encontrado por ai, cheios de vontades e esperanças. A nossa maior liberdade é poder estar sempre na busca da felicidade. Nós sabemos o caminho, afinal aquela luz no fim do túnel é ou não é nossa? De testa franzida a olhar o sol, a cidade caminha ao som das marés. A poesia não ousa silenciar.

           A força de Fortaleza é o pleonasmo mais bonito que já pôde ser dito. Gramáticos, me ouçam sem fazer careta:  Nossa Fortaleza  é forte que só a peste! Traz a destreza e o desastre dos verdes mares. Ora serena, ora revolta. Fortaleza se movimenta e acalma. Proclama guerra aos brados nas ruas e nas praças.  Faz amor à sombra dos coqueiros.

         Feito maré que invade a rua e lava a calçada, os nossos fortes gritam revolução em coro, cantado na dor, nas ruas, corados de amor. 

         Minha Fortaleza brada poesia ainda sem nome, sem rima nem métrica, mas, com a força de sempre, transborda-se e inspira, sem olhar pra trás. O sol surge logo ali.

Fortaleza, 4 de agosto de 2013.

-Talita Nogueira-