segunda-feira, 22 de setembro de 2014

UM LIVRO PARA SETEMBRO

A menina que não sabia ler (original: Florence and Giles)
Autor: John Harding - Editora: Leya

                 Depois de um sufoco trancada num quarto, estudando para uma prova e, por achar que sufoco é sempre pouco (mentira!), lancei-me no sufoco de A menina que não sabia ler. Numa leitura desesperada, trancada entre 282 páginas aceleradas, cinematográficas, asfixiantes... A menina não sabia ler, eu sabia ( o que dessa vez não me pareceu vantagem, juro) e me pareceu, nestes 4 dias desesperados, que o preço da leitura era a asma. Conclui a leitura ofegante e trêmula.  O enredo puro do livro não é lá grande coisa, nada inédito e improvável,  mas o desenrolar das páginas é fascinante. Por isso não tomarei meu tempo contando a história em três linhas, mas assegurando que A menina que não sabia ler é quase um lutador de esgrima te empurrando com a ponta da espada à beira de um lago gelado. O livro me deu alguns beliscões... é disso que eu tô falando,  de provocações,  de hematomas pós livro,  de incômodos,  de prender o dedo na última página pra não deixar a história acabar. Meio febril, meio trêmula,  com medo de observar longamente o espelho,  tive vontade de coisas nunca pensadas antes como: devorar Shakespeare, ter um cavalo,  ler Macbeth, passar uma semana sem eletricidade, conviver com as velas, contar a passagem do tempo pelos pios da coruja, fugir dos espelhos. Eu nem sei ao certo quais as impressões finais sobre este livro, e, diga-se de passagem, isto não é uma resenha. É apenas o primeiro suspiro de quem acabou de emergir de uma longo mergulho a prender o ar. Eu nem devia estar traçando estas linhas, porque, afinal, ninguém imagina que eu saiba ler ou escrever. As ordens de meu tio foram claras sobre eu não ser alfabetizada. Não contem nada para ele, por favor. Eu sequer conheço o caminho até a biblioteca e, se perguntarem por mim, estarei cá com meus bordados ao colo, estagnados,  num desenho nunca terminado, porque, caso não saibam (esse segredo é nosso), eu nem sei bordar.

P.s: John Harding, meu amor, deixe as crianças dormirem....


terça-feira, 16 de setembro de 2014

Por hoje...

Desposse

Queridos nobreza, clero e burguesia
Quero ser uma desclassificada
Não enquadrada
Não tipificada
Nada

Quero ser a unicidade perdida na multidão
Desforme
Fora dos conformes
Feito torta que transborda a forma
Porque de tão doce não  cabe em contornos
Torta 
líquida 
Sem classe
Nem face
Sem cara pra dar à tapa
Sem heranças
Sem marcas

Não me peguem pelo braço
Que eu não quero entrar na roda nem seguir a fila
Não me enviem convites
Que eu não sou de honras
Não me deem cotas que eu não participo
Não encham suas bocas pra falar meu sobrenome
Que eu não sou de sangue
Não me chame pelo nome 
Que eu não escolhi

Não me chame
Simplesmente não me chame
Que eu não vou


sábado, 13 de setembro de 2014

Por hoje...

Olha, menina, é a hora...
Não deixe o vento bagunçar teus cabelos...
É hora de girar a roda, de movimentar, de fazer bagunça
É hora de ser vento!
Só tu não percebeste ainda que és filha de ventania...
Vai...


                                                                                                           Fotografia: Serra de Guaramiranga - Ce, 2013